Quando pensamos em espiritualidade não podemos evitar certas maneiras de pensar: a conexão com o divino, a ascenção da alma, a viagem astral e todas outras idéias que já ouvimos e compomos na nossa cabeça. Dentro todas as atividades que compõe o conceito amplo de espiritualidade, a meditação tem alguns pontos interessantes, que precisam ser vistos antes e assim o que é samadhi possa ser clarificado.
Primeiro vejamos a caricatura do meditador: alguém sentado imóvel de olhos fechados; depois criamos a idéia de que existe alguma experiência diferente ocorrendo na mente, seja alguma luz colorida, ou uma experiência de sair do corpo ou simplesmente o silêncio da mente; e por fim existe ainda para alguns a crença que a meditação é uma questão de aptidão e assim ou não é algo que somos capazes de fazer ou é algo que já deveria ser capaz de fazer. Todas essas idéias são naturais mas em realidade o processo de meditar é algo bem diferente.
Essa maneira de pensar pode ser exagerada quando pensamos na atividade de meditar mas ela existe em vários outros campos também. Quando olhamos uma obra de arte de um artista plástico o processo de construção da obra mesmo que seja o processo criativo fica escondido para nós. Imaginamos que o Salvador Dali só pega o azul e pinta, depois o verde, depois o amarelo e pronto o quadro fica pronto. Quem não é um artista em geral não tem a dimensão do que envolve fazer uma pintura: o esboço, a perspectiva, o estilo, a emoção, o angulo que quadro será visto, a combinação de cores, a simbologia dos elementos, o elemento socio-cultural que está sendo abordado e a mensagem passada, a emoção do artista e por fim, a empatia emocional gerada no apreciador, que em última instância nos faz achar o quadro bom ou ruim.
São tantos aspectos que a pintura ou a meditação contêm, que quando resumimos a passar a tinta na tela ou sentar de olhos fechados estamos bloquando todo um universo de conhecimento a nossa frete.
A idéia de que o fato de fecharmos olhos nos trará uma experiência diferente do normal não é lógica. Que diferença faz olhos abertos ou fechados?! Se com olhos abertos nossa mente não fica em paz ou em silêncio de olhos fechados por que ficaria? E ainda se a mente em silêncio fosse o resultado da meditação qual seria o seu propósito? Desligar a mente? Por isso dizemos que essas são apenas idéias que carregamos, mas elas podem amadurecer em entendimentos importantes no caminho espiritual de uma pessoa, quando existe honestidade na busca, desapego e a presença de um professor.
A meditação é um símbolo para espiritualidade pois vários mestres que conhecemos por faziam essa atividade, mas o que é a meditação? o que se passa na cabeça de alguém meditando?
Sobre isso a tradição separa o nome abrangente de meditação em vários pequenos grupos de atividades: a prática da imobilidade corporal, os exercícios respiratórios, as práticas de visualização energéticas, as visualizações de imagens e luzes, a repetição de mantras, a contemplação em Deus e a contemplação da mensagem dos Vedas.
De uma forma ampla todos essas atividades são chamadas de meditação, mas cada uma tem um propósito e o “como”, “quando” e “quanto” são definidos entre mestre e discípulo.
Essas atividades vão trazer saúde para o corpo: balanço hormonal, correção do ph e vários outros benefícios físicos. E no nível mental: objetividade em relação a emoções, equilíbrio emocional, capacidade de concetração, velocidade de raciocínio, capacidade de abstração e por fim a apreciação da natureza do sujeito fruto do estudo dos Vedas. Motivo pelo qual a meditação é parte integrante do estilo de vida de yoga.
Devido aos benefícios físicos e psicológicos comprovados a ciência moderna já reconhece o uso da meditação como prática terapeutica e para saúde, mas do ponto de vista tradicional esse é um efeito colateral. No mundo espiritual as meditações são conhecidas como capazes de trazer poderes e capacidades extra-sensoriais e muitas pessoas se interessam devido a essa possibilidade mas esse também é um efeito colateral, apesar de muito raro hoje em dia. Como o corpo e a mente são ferramentas para nossa vida e a meditação vai atuar nessas duas esferas, considerando também a esfera enegética e psicofísica nesse bloco, a meditação é apenas um meio para melhorar a eficiência do uso dessas ferramentas. Um mestre constumava dizer assim: o banho limpa o corpo, a meditação limpa a mente. Um corpo e uma mente limpa são os instrumentos necessários para traçar seu caminho espiritual.
E onde entra o samadhi?
Algumas pessoas vão ter diversas explicações com outros nomes que não sugerem muito: “É a expansão da individualidade, o fim do eu, a hiper-consciencia, um estado trancedental etc…” De acordo com as escrituras e a etimologia da palavra samadhi é a permanência da mente com absorção em um determinado assunto. Nesse contexto de meditação o estado de absorção é chamado de samadhi.
Ele não é um estado transcendental, nem requer a expansão de nada em específico. Inclusive a definição da palavra consciência é “aquilo que vê” e não está sujeita a expansão ou redução, isso é importante pois no contexto psicológico muitas vezes a palavra consciência é utilizada para se referir a mente, o que não é o caso aqui.
Um jogador de tenis quando está no calor da partida, tem a mente absorvida, ele não pensa onde vai bater, ele nem acompanha a bola ou calcula sua trajetória, existe uma suspensão conginitva da idéia de jogador, bola e raquete; e nessa mágica a pessoa só joga, o pianista só toca, o bailarino só dança e o Salvador Dali, sem pensar, passa o pincel em três cores distintas e faz o traço que completa a obra com o toque de um gênio.
A mente humana é capaz de entrar nesse estado de absorção, ele é chamado de samadhi e um mestre de meditação é capaz de dominar a entrada da sua mente nesse estado. Esse fenômeno permite grandes insights, a realização de tarefas com maior desempenho, porém seu propósito maior é usá-lo para o entendimento da natureza do sujeito, o autoconhecimento ensinado pelo professor. Então o samadhi é algo que está disponíve para toda mente, que em alguns campos também está presente na nossa vida e é um processo natural dentro do estudo tradicional de meditação.